sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Breve explicação sobre o que é cultura


Queridas amigas, queridos amigos, 

Nós encontramos hoje para compartilhar uma aspiração comum: o dialogo e a convergência entre as culturas. 
Por alguma razão nos parece uma aspiração válida, a de um mundo em que todos os seres humanos que vivem neste tão pequeno planeta, possam reconhecer-se iguais e que toda a extraordinária diversidade que se tem desenvolvido ao longo da historia seja uma riqueza para todos... Até o último canto da Terra. 
O Que nos leva a empreender este caminho? Que há nas culturas que nos atraí e nos faz lutar para que ninguém nesta terra se sinta estrangeiro?  
A palavra “cultura” tem vários significados e etimologicamente está tomado de um antigo idioma ocidental, o latim, e deriva do verbo “colere” cultivar. Esta é uma primeira dificuldade frente à possibilidade de diferentes palavras que em outros tantos idiomas expressam o que nós queremos expressar com a palavra “cultura”. 
E claro esta que mais além do problema idiomático esta o problema do significado: o que é uma “cultura”, ou melhor, o que são as culturas?
Uma vez que se tente uma resposta a estas perguntas não será perezoso perguntar-nos: é possível um dialogo entre pessoas de culturas tão diferentes? É possível uma convergência entre diferentes culturas?  
Assim, perguntas trazem perguntas. Gostaríamos que nos acompanhassem nesta reflexão sobre este tema que tanto nos inspira.
 
Muitas obras têm sido escritas para compreender o funcionamento e o destino das culturas. Em todas estas tentativas podemos reconhecer interessantes contribuições. No entanto investigadores, antropólogos, sociólogos e filósofos não consideraram que a paisagem com que contaram contribuiu para direcionar seus olhares e consideraram o ser humano como um simples epifenomeno de seu objeto de estudo.  
Vejamos unos casos:  

Em 1871, o antropólogo inglês Edward Tylor, em seu livro "Cultura primitiva", definiu cultura como "aquele conjunto complexo que incluí o saber, as crenças, a arte, a moral, o direito, o costume, e toda capacidade e hábito adquiridos pelo homem em quanto membro da sociedade".  
 
Oswald Spengler entre 1918 e 1922 - quer dizer entre os últimos meses da primeira guerra mundial e a imediata pós - guerra em um período em que começa a acentuar-se a consciência de uma crise social, econômica, política, intelectual e de valores, publica "O ocaso do Ocidente". 
Segundo uma "lógica orgânica da historia" interpreta a cultura como um organismo. Cada cultura/organismo representa um mundo em si; entre as civilizações não é possível nenhuma comunicação, visto que cada civilização cria seus próprios valores e entre elas não há valores comuns. O protagonista da historia não é o homem, se não a "cultura". Esta, em quanto organismo, segue a mesma sorte da natureza: tem seu nascimento, um desenvolvimento segundo um destino necessário e um inevitável ocaso. Tal ocaso ocorre quando todas as suas potencialidades se relacionam e a isso segue um inexorável processo de decadência.
 
A visão spengleriana da "civilização" [Zivilisation] como momento último de uma cultura [Kultur] não impediu que Arnold J. Toynbee a assumisse como unidade de investigação. Já na introdução de "A Study of History" - onze volumes escritos entre 1934 e 1954 - discutindo o problema da unidade histórica mínima, Toynbee abandona a "historia nacional" e se interessa sobre tudo pelo estudo comparado das civilizações. Identifica 26 civilizações1. Segundo Toynbee o sujeito da historia já não é um ser biológico que está marcado pelo destino, senão uma entidade guiada por impulsos o impedimentos entre o aberto e o fechado. Um tipo de retro-resposta da conta do movimento social. Por último, a seu entender, as grandes religiões transcendem a desintegração das civilizações e são as que nos permitem intuir um «plano» e um «propósito» na historia.  
 
Concluída a Guerra Fria, Samuel P. Huntington no artigo "The Clash of Civilizations?” em 1993 chegou ao livro "The Clash of Civilizations and the Remaking of World Order" em 1996, volta a afrontar o tema das culturas. Em oposição à tese de "O fim da Historia" formulada por Francis Fukuyama, Huntington afirma que os conflitos do século XXI verificaram-se com maior freqüência e violência ao longo das linhas divisórias entre as culturas (ou civilizações como as islâmica, ocidental, chinesa, etc.) e já não por razões político-ideológicas, como ocorreu no século XX.  
 
Alguns estudiosos, para definir as civilizações utilizam a teoria dos conjuntos.
Outros focalizam a atenção sobre o desenvolvimento tecnológico, destacando como a civilização industrial vai progressivamente reemplazando a anterior civilização agrária e se predice uma ulterior transformação relativa na sociedade da informação. A "escala de Kardashev" classifica as civilizações sobre a base de seu estado tecnológico, principalmente medindo a quantidade de energia que são capazes de utilizar.
Alguns movimentos feministas identificam uma mudança de civilização com o começo da dominação masculina sobre a mulher.
Os movimentos ambientalistas o identificam com o começo da exploração excessiva dos recursos naturais, ao qual se tem que contrapor um desenvolvimento sustentável.  
Finalmente John Zerzan, um dos principais expoentes de anarco-primitivismo, vê a civilização como algo que obriga os seres humanos a viver de modo não natural, a oprimir os mais debilitados e a prejudicar o entorno. Seus trabalhos criticam a civilização como inerentemente opressiva, e defendem a volta das formas de vida do caçador – re-coletor pré-histórico.
   
Quais são as culturas para o Novo Humanismo?  
Em primeiro lugar, observamos que as culturas são produtos exclusivamente humanos, não se vê seus vestígios no mundo animal.   
Por tanto, se queremos contestar a pergunta "Quais são as culturas?" é necessário primeiro responder a pergunta "O que é o ser humano?". 
Observamos o ser humano como um ser histórico cujo modo de ação social transforma a sua própria natureza graças à reflexão do histórico - social como memória pessoal. 
Em outras palavras: no ser humano no existe «natureza» humana, e se há algo «natural» no ser humano é a mudança, a historia, a transformação.
Isto nos permite liberar-mos das idéias de “ordem natural”, "moral natural", "direito natural", “instituições naturais”, porque nesse campo tudo é histórico-social e nada ali existe por natureza.
Inclusive nos permite liberar-mos da idéia que a consciência humana seja passiva. Ao contrario da coopresença da consciência humana que trabalha graças a sua enorme ampliação temporal e se a intencionalidade da consciência permite projetar um sentido, o característico do ser humano é ser e fazer o sentido do mundo, o transformando. 
Mas, Por que necessitaria o ser humano, transformar o mundo e transformar-se a si mesmo? Pela situação finita e carência tempo espacial em que se encontra e que registra como dor (física) e sofrimento (mental). 
A superação da dor não é simplesmente uma resposta animal, imediata, e natural, senão que é uma resposta deferida e uma construção frente à possibilidade futura da dor ou presença da dor em outros seres humanos, que se experimenta como sofrimento. 
Assim a superação da dor aparece como um projeto básico que guia a ação.  
É essa intenção é que tem possibilitado a comunicação entre corpos e intenções diversas ao qual chamamos de «constituição social». A constituição social é tão histórica como a vida humana, é a configuração da vida humana. Sua transformação é continua, mas de um modo diferente ao da natureza. Nesta no ocorrem as mudanças sem as intenções.  
Sendo assim as coisas, estamos agora em condição de contestar a pergunta "Quais são as culturas"? 
Podem-se entender as culturas como os conjuntos de respostas que os grupos humanos geram ao longo de seu processo de adaptação ao meio para satisfazer suas necessidades para a superação da dor e do sofrimento.  
As culturas incorporam a experiência social, a paisagem e as condições naturais em que um conjunto humano foi formado (sua arte, suas ferramentas, sua arquitetura, as formas de produção, o modo de organização, etc.), assim como suas aspirações, crenças, mitos, e códigos úteis para suas relações. Estes elementos tangíveis e intangíveis se configuram de tal maneira, que transformam as condições existentes, ao tempo que expressam os valores que dão direção e significado no âmbito pessoal e coletivo. 
As culturas não são simples respostas refletidas frente aos condicionamentos e determinismos externos. São antes tudo a expressão da intencionalidade humana, são configurações temporais em que prima o futuro.  
Também  é acumulação da memória histórica que se transmite de distintas formas convertendo-se o cultural no estabelecido. Mas, se bem a cultura estabelecida tenda a perceber-se como algo imóvel e permanente, sempre está submetida a uma transformação.  
Estas são algumas considerações com as quais temos querido aproximar-mos ao nosso tema. Considerações que encontram maior desenvolvimento e fundamentos em nosso Caderno da Convergência das Culturas e que, por certo, se enriqueceram com os numerosos aportes que necessitamos. 
Os aspectos mais profundos de uma cultura, a partir da própria, podem ser difíceis de se perceber e se podem develar quando se aprofunda no diálogo. Um dialogo que por experiência sabemos que é possível no momento em que colocamos como condição o ser humano como valor central.

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